"O conceito de raça como categoria biológica deve ser
abandonado.
Embora a
definição de raça não apresente consistência científica, tem sido empregada
como categoria taxonômica baseada em traços hereditários comuns – como a cor da
pele – para elucidar a relação entre a ancestralidade e os genes.
O uso do
conceito biológico de raça em pesquisas genéticas, no entanto, é considerado
enviesado e pernicioso.
A
controvérsia vem de longe. No início do século 20, o sociólogo W. Du Bois foi o
primeiro a contestar a existência de evidências científicas que justificassem o
conceito de raça. Ao contrário do pensamento vigente, Du Bois afirmava que as
disparidades de saúde entre negros e brancos seriam explicadas pelas
desigualdades sociais, não por diferenças entre os genes.
Considerado
o Darwin do século 20, Theodosius Dobzhansky enfrentou o problema dos
geneticistas modernos: como definir e escolher a amostragem de genes em
populações humanas?
Durante
boa parte de sua carreira brilhante, defendeu que a dificuldade não estava no
significado científico, mas no uso inadequado do termo raça. Com o passar dos
anos, entretanto, convenceu-se de que o estudo da diversidade humana ficava
prejudicado pelo conceito de raça.
Ainda
hoje, os geneticistas continuam divididos a respeito da utilidade desse
conceito em pesquisas biológicas. Existem três linhas de pensamento:
1)
Para alguns, podem ser encontradas informações genéticas relevantes nos grupos
raciais, importantes para avaliar a diversidade;
2)
Outros, ao contrário, acham que o conceito de raça é irrelevante e impreciso
para entender e mapear a diversidade humana;
3)
Outros, ainda, defendem que a natureza heterogênea dos grupos raciais tornam
questionáveis as previsões dos estudos clínicos baseados nas diferenças entre
as raças.
Nos últimos
anos, diversos encontros científicos procuraram chamar a atenção para os
seguintes pontos:
1)
Na interpretação de aspectos raciais/étnicos, o foco deve estar no racismo (ou
seja, nas relações sociais) e não numa suposta predisposição biológica inata de
cada raça;
2)
Os cientistas encontram dificuldade para distinguir as categorias raciais com
as quais os indivíduos se identificam;
3)
A preocupação com o uso nocivo das conclusões tiradas em pesquisas genéticas
que utilizam variáveis raciais/étnicas.
É
fundamental estabelecer as diferenças entre ancestralidade e raça.
Ancestralidade
é um conceito baseado num processo, numa afirmação sobre as relações do
indivíduo com outros que fazem parte de sua história genealógica. É um
entendimento muito pessoal a respeito da herança genética.
Raça, por
outro lado, é um conceito baseado num padrão que tem levado cientistas e leigos
a tirar conclusões sobre organizações hierárquicas, que conectam o indivíduo a
um grupo social construído ou circunscrito geograficamente.
As
novas tecnologias que permitem sequenciar os genomas de centenas de milhares de
indivíduos demonstram que classificações raciais não fazem sentido em termos
genéticos, como Dobzhanski previu há mais de oitenta anos."
(*) Artigo
escrito pelo Dr. Drauzio Varella
Nenhum comentário:
Postar um comentário